terça-feira, 17 de maio de 2011

Quem me vende o silêncio?

Compraria agora,
Por um bom punhado de tostões
Alguns bons instantes de silêncio.
Não o silêncio físico,
Mas o mavioso som do calar d'alma.
Muito bem eu recompensaria
Pela paz da ignorância...
O não-saber vale todo o meu tesouro.
Pagaria muitos dobrões de ouro
Só para não me ouvir;
Emudecer a vozinha
Insistentemente irritante
E enlouquecedora
Da minha própria consciência
Inútil...
Inerte...
Frágil...
Inconstante.
Essa consciência vaga,
Distante, esquizofrênica
E arrebatadoramente delirante.
Anseio pelo calar
Da pura ilusão 
E da ilusão pura
De uma consciência idílica.
Consciência ferida
Que agoniza sufocada
Na acidez do próprio vômito.
Voz alta e esganiçada
Que alardeia devaneios e desvarios
Dos sentires agonizantes
(agonizar vem de "agonia" ou de "algoz"?)
Quem me vende o silêncio?
Interessante perceber como o homem, desde a sua mais primordial existência anseia pelo entender. A busca pela razão é quase tão ávida quanto à do Graal. Lamentável ver que a humanidade sempre caminha inversamente ao que é relevante para a vida. Não precisamos entender a razão, ela se auto-esclarece... Necessitamos entender os sentimentos, grandes responsáveis pela perda da razão. Esses sim, o grande mistério a ser revelado.

Hamlet moderno: ser gay ou não ser.


 As últimas notícia que têm chegado ao meu conhecimento estão me deixando verdadeiramente orgulhosa com a evolução moral do nosso país. As acalouradas discussões travadas em todos os níveis da nossa sociedade, mormente na esfera legislativa, conduzem à conclusão de que a partir de agora não se pode mais, em território brasileiro, privar os homossexuais de quaisquer direitos constitucionalmente conferidos à pessoa humana.
Curioso, na minha ignorância eu já pensava que os homossexuais, desde sempre, não poderiam ter seus direitos tolhidos pelo simples fato de que eles são pessoas humanas. Mas não, estou vendo que as coisas não eram bem como eu as concebia. É preciso uma lei que confira aos homossexuais o direito, por exemplo, de não ser demitido do seu trabalho devido à sua condição sexual. E eu que, tola, pensava que em todas as instâncias trabalhistas as dispensas discriminatórias em geral já eram devidamente rechaçadas.
Na faculdade eu aprendi que matar alguém é crime ou que a dispensa discriminatória de empregado era nula. Mas nenhum dos meus professores me avisou que tais direitos não atingiam aos homossexuais.
Quanta bobagem! Quanto dinheiro público jogado ao vento com tanta discussão inócua.
Os homossexuais têm todos os seus direitos resguardados, os quais devem ser respeitados independente de todo esse espetáculo.
Se eu fosse gay estaria seriamente preocupada com o rumo que as coisas estão tomando. Logo após uma brilhante e tardia decisão do STF que reconheceu direitos jurídicos à união homoafetiva, a elite se volta contra tal decisão de uma maneira tão sutil que é quase impossível perceber todo o preconceito que se esconde atrás do Projeto de Lei do crime de homofobia.
A consolidação do crime de homofobia nada mais faz do que jogar por terra todos os direitos até então conquistados, ou seja, é como dizer que o homossexual precisa de um tipo penal específico que o proteja. Por que? Porque sãoconsiderados sob-pessoas, ou seja, são débeis que dependem de tutela legal específica. Todos os movimentos de defesa dos direitos das pessoas homossexuais deveriam se voltar contra a aprovação deste projeto de lei discriminatório e exigir que os gays sejam respeitados pelo simples fato de que são seres humanos como qualquer outra pessoas e não porque optaram por manter relações afetivossexual com pessoas do mesmo sexo.
Mas o mais triste de tudo é que venho percebendo que a maioria das pessoas não está conseguindo fazer distinção entre a defesa dos direitos do homossexual e a defesa da homossexualidade. Está todo mundo achando que manifestar-se contra a homossexualidade é crime. Imaginem uma entrevista de emprego, alguém teria coragem de se posicionar contra a homossexualidade? Provavelmente o canidadto iria até se declarar gay acreditando que a chance de ser contratado aumentaria. Quem sabe a lei que cria quotas de empregos para homossexuais é aprovada? Queria saber como serão feitos os testes para aferir a veracidade da alegação (mas isso é matária para outra discussão).
O que consigo perceber é uma equivocada inversão de valores. Os programas de televisão, antes de defenderem os direitos dos homossexuais estão fazendo verdadeira apologia à homossexualidade. Os nossos adolescentes estão absorvendo uma cultura, não de respeito às diferenças, mas de adesão às diferenças. Respeitar aos homossexuais não implica em se tornar homossexual. Não tardará o dia em que o pai expulsará de casa o filho que se declarar heterossexual acusando-o de homofobia.
As pessoas estão com medo de dizer que são atraídas pelo sexo oposto e serem consideradas homofóbicas. Aí está a inversão de valores. Todos são obrigados a respeitar os direitos dos homossexuais, mas, para tanto, não tês que se tornar homossexuais.
Ao contrário do que está parecendo, as pessoas continuam tendo o direito de possuir somente parceiros sexuais do sexo oposto, de não quererem que seus filhos sejam gays e de se manifestarem livremente contra a homossexualidade. Elas só não podem tentar impedir que os gays exerçam livramente seus direitos. O direito de ser heterossexual tem que ser igualmente garantido. EU NÃO QUERO SER OBRIGADA A VIRAR LÉSBICA!!!!!
Se Shakespeare criasse o príncipe Hamlet nos tempos atuais, certamente a famosa frase teria que ser: “ser gay ou não ser”, para poder estar politicamente correta.
E pior, o brasileiro, famoso pelo seu extenso anedotário, fica de mãos atadas (literalmente algemadas) na hora de contar aquela piada ótima da “bichinha”. Ainda bem que sobraram a loura, o Joãozinho, o português, o político e o papagaio. Este último não tenho tanta certeza, tendo em vista aos movimentos de proteção aos animais.
A única coisa que eu sei é que: se quiser ser gay que seja, mas seja magro, porque se estiver acima do peso vai continuar sendo discriminado e, o mais importante, respeite o meu direito de não querer ser gay.

terça-feira, 10 de maio de 2011

ROTEIRO PARA CÁLCULO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE


Para se calcular a pena de um autor de prática criminosa, deve-se partir do disposto no art. 68 do CPB, observando-se que o CPB adotou o sistema trifásico de dosimetria da pena, defendido pelo jurista Nelson Hungria, pelo qual deverá o juiz deverá seguir 3 passos: inicialmente fixar a pena-base, considerando as circunstâncias judiciais; em seguida, deverá ater-se às atenuantes e agravantes; e, por último, às causas de diminuição e de aumento de pena.

 Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

A pena-base é fixada ente o mínimo e o máximo cominado, segunda a discricionariedade do juiz, contudo, este deverá fundamentar suficiente o motivo de qualquer exasperação da pena além do mínimo, sob pena de nulidade da sentença.

PENA-BASE

            Para que seja possível o cálculo da pena-base, é necessário o conhecimento das circunstâncias judiciais que pesarão na sua fixação mais para perto do mínimo ou para perto do máximo.

1) CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS: São circunstâncias subjetivas que integram o ato delitivo e estão elencadas no art. 59 do CPB, a saber:

a) Culpabilidade: Na análise da culpabilidade, o juiz deverá, dimensionar a culpabilidade pelo grau de intensidade da reprovação penal. Em crimes culposos, deverá se valorado a maior ou menor capacidade de se prever e evitar o resultado danoso. Tratando-se, contudo, de crime doloso, a análise da culpabilidade será feita com base na intensidade do dolo. Quanto maior for o esforço do agente para a prática criminosa, maior a intensidade do dolo e, logo, maior a reprovação penal.
EX; FELISBINO, passando pela rua, percebe que o veículo de ANACRÉCIA, encontra-se aberto e com a chave na ignição. Tentado com a oportunidade, entra no veículo e pratica o furto. Vê-se, que no exemplo, Felisbino não precisou empreender grande esforço para consumar o delito. Seu dolo deverá ser considerado menos intenso (brando), pois, embora sua atitude continue sendo reprovável, tem-se que ele somente aproveitou de uma oportunidade que já havia sido criada.
Por outro lado, se o veículo estivesse devidamente trancado, é certo que Felisbino precisaria empreender maior esforço, sendo necessário arrombá-lo ou abri-lo com gazua (chave mixa). Dessa forma, verifica-se que agiu com dolo mais intenso, pois não se aproveitou de uma situação preexistente, mas deixou evidente que estava determinado a praticar o furto.
Assim, quanto maior a dificuldade e a preparação para a prática do crime, maior é a intensidade do dolo e, conseguintemente, da culpabilidade.
Resumindo, trata-se de verificar o maior ou menor grau de exigibilidade de outra conduta, considerando, neste tocante, as características pessoais do agente dentro do exato contexto de circunstâncias fáticas em que o crime ocorreu. Quanto mais exigível a conduta diversa, maior é a reprovação do agir do sentenciado.

b) Antecedentes: Não se confunde com reincidência. Esta somente ocorrerá se o autor já possuir contra si, NA DATA DO NOVO DELITO, condenação penal transitada em julgado.
Trata-se de verificar condutas pregressas do acusado, as quais sejam judicialmente reprováveis. (antecedentes desabonadores referentes à vida privada do acusado do ponto de vista social e moral, serão considerados na análise da conduta social ou da personalidade do agente, dependendo do caso).
Somente fatos anteriores à prática do delito que se está punindo podem caracterizar antecedentes, cuja pena não tenha sido integralmente cumprida ou extinta há mais de 5 anos (art. 64, inciso I, do CPB).
Também não se pode considerar, aqui, a reincidência, porquanto esta deverá ser considerada na segunda etapa dosimétrica, por constituir circunstância agravante (art. 61, I, do CP).
Para melhor análise dos antecedentes criminais, de grande valia o critério de exclusão proposto pela Professora Maria Fernanda Podval, [1] segundo a qual, como conseqüência do princípio constitucional da presunção de inocência, não se podem considerar como maus antecedentes: a mera instauração de inquérito policial, nem a existência de ações penais em andamento, nem mesmo quando há sentença penal condenatória que ainda não transitou em julgado.
Ora, se a CRFB estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não é razoável que a pena de alguém seja aumentada em razão da mera POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM OUTRO PROCESSO, que é também, a princípio, POSSIBILIDADE DE ABSOLVIÇÃO.
Infelizmente, esse posicionamento não é pacífico em nossos Tribunais.
Ainda, segundo o critério de exclusão Não podem, ser consideradas como maus antecedentes as condenações anteriores por crimes militares próprios e por crimes políticos, fatos ocorridos antes da maioridade penal do condenado, as condenações cuja pena foi cumprida ou extinta há mais de cinco anos da prática delitiva, as propostas aceitas de suspensão condicional do processo e de transação penal, nem os acordos civis extintivos da punibilidade, bem como a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva do estado em outra ação penal.
Deve-se concluir, portanto, que por maus antecedentes entendem-se apenas AS CONDENAÇÕES ANTERIORES POR CONTRAVENÇÃO E AS CONDENAÇÕES COM TRÂNSITO EM JULGADO APÓS A SEGUNDA CONDUTA.
No caso de condenação por contravenção, deve-se excluir o caso do agente que está sendo julgado por prática de contravenção penal e que já possuía anterior condenação por contravenção: aí será considerado reincidente, como dispõe o artigo 7º da LCP (Lei de Contravenções Penais).

c) Conduta social: Diz respeito ao comportamento do agente em relação à comunidade em que vive. Devem ser examinados, nessa ocasião, os elementos indicativos do bom ou mau relacionamento do agente em face do meio social que integra (e não na sociedade que o Magistrado considera saudável ou ideal). Se o meio social do agente é uma favela, deverá ser avaliado de acordo com o comportamento social médio da favela e não dos integrantes de classes sociais mais abastadas e, vice-versa.
          Analisa-se basicamente 3 fatores: FAMÍLIA, TRABALHO E RELIGIÃO, examinando-se, nesses 3 campos o modo de agir do agente nas suas ocupações, sua cordialidade ou agressividade,  seu estilo de vida honesto ou reprovável; a vocação do acusado para o trabalho ou para a ociosidade; a afetividade para os membros da sua família, vizinhos e colegas de trabalho; a respeitabilidade que goza daqueles que o conhecem; se possui hábitos socialmente reprováveis, como uso habitual e excessivo de álcool e drogas; se é pessoa que freqüenta ambientes saudáveis ou ambientes degradantes como prostíbulos; se procurou estudar; se é visto frequentemente em companhias suspeitas.
A valoração da conduta social não se confunde com o exame dos antecedentes. Há casos em que o agente possui antecedentes criminais e boa conduta social e vice-versa.

d) Personalidade do agente: Trata-se da análise da índole do agente, sua maneira de agir e de sentir, seu grau de senso moral, não se podendo, contudo, sopesar elementos que já foram avaliados quando da análise da conduta social do agente.
A conduta social leva em conta a interação do agente com outras pessoa; já, a personalidade, diz respeito unicamente ao modo de ser do sentenciado, como, por exemplo, perversidade, ardilosidade, etc.

e) Motivos do crime: Trata-se do móvel da conduta. Quanto mais reprovável o motivo, maior reprovabilidade terá a conduta. Por exemplo, o furto praticado pelo pai de família desempregado, será menos reprovável do que o furto praticado pelo usuário de drogas, a fim de adquirir o entorpecente.
A ausência de motivos para a prática do crime não pode ser considerada como fator de maior reprovabilidade da conduta, pois falta de motivo não é mau motivo.

f) Circunstâncias do crime: São todos os elementos do fato delitivo, acessórios ou acidentais. Tratam-se das peculiaridades do fato.
Alberto Silva Franco[2] sugere que o Juiz analise: "o lugar do crime, o tempo de sua duração, o relacionamento existente entre autor e vítima, a atitude assumida pelo delinqüente no decorrer da realização do fato criminoso"
“É mais censurável a conduta do agente que matou alguém na igreja ou na casa da vítima do que aquele que a matou em sua própria casa. Por outro lado, é menos censurável o agente que se demonstrou sinceramente arrependido da prática delitiva do que aquele que comemorou o evento embriagando-se”. [3]
Ao contrário do que se vê em filmes americanos, não há, no direito brasileiro o agravamento da pena ou a qualificação do crime devido à PREMEDITAÇÃO. Não obstante, o fato de ter sido o delito arquitetado e elaborado previamente constitui circunstância a ser sopesada neste momento.

g) Conseqüências do crime: É a própria extensão do dano causado à vítima ou à sociedade pelo crime praticado. É a maior ou menor intensidade da lesão jurídica causada à vítima ou a seus familiares. Ex. no caso de furto, há que se observar se o produto do crime foi recuperado e devolvido intactamente à vítima, ou se este se perdeu.

h) Comportamento da vítima: Trata-se da análise de que se a vítima, de algum,modo, consciente ou inconscientemente, contribuiu para a ocorrência do crime. Ex. proprietário que deixa o seu veículo aberto e com a chave na ignição em local propício a furtos. Estupro praticado contra mulher que aceita ir a um motel com um homem somente para namorarem e se recusa à pratica sexual.
Quando o comportamento da vítima contribuiu para a prática do delito, esta circunstância será valorada, pelo Juiz, a favor do condenado.
1ª. ETAPA: CÁLCULO DA PENA-BASE: Para se calcular a pena-base, parte-se da pena cominada para o delito, observando-se que se tratar de crime privilegiado ou qualificado, prevalecerá a pena cominada para a espécie.
Ex. Furto simples (art. 155, caput): reclusão de 1 a 4 anos;
         Furto qualificado (art. 155, §4º, inciso III): reclusão de 2 a 8 anos.
Assim, se o agente praticou furto simples terá sua pena-base fixada entre 1 e 4 anos. Se praticou furto qualificado, sua pena será fixada entre 2 e 8 anos.

Se o crime possuir mais de uma qualificadora. Ex. furto praticado com destruição ou rompimento de obstáculo e mediante concurso de pessoas. Apenas uma qualificadora será utilizada para cálculo da pena-base. A outra poderá ser considerada como agravante genérica se estiver elencada no rol do art. 61 do CPB ou, se não for agravante genérica, poderá ser considerada como circunstância judicial negativa.

OBS: Agravantes e atenuantes genéricas são aquelas que se encontram na parte geral do CPB (art. 61 e 65).

CASO:  Ambrosino, penalmente menor com 20 anos, curso superior incompleto, desempregado, usuário de drogas, mas sempre auxilia o padre durante as quermesse e missas, em 09/08/2010, em companhia de Jumentino Capa Preta, bandido famoso no bairro, junto ao qual sempre é visto, invadiu a residência do seu irmão durante o horário de repouso noturno, mediante a escalada do muro de 2m de altura e arrombamento da janela e subtraiu duas bicicletas novas, sendo uma delas importada e de alto valor por ser fabricada com material especial, tendo em vista que a vítima é ciclista profissional.
Posteriormente, as bicicletas foram recuperadas e devolvidas à vítima.
Preso, Ambrosino foi denunciado e condenado nas iras do art. 155, §1º e §4º, incisos I e IV, c/c art 61, , incisos I e II, alínea “e”, c/c art. 65, inciso I e III, alínea “d”, todos do CPB.
Durante o interrogatório, Ambrosino confessou espontaneamente a prática do furto e informou, também já foi definitivamente condenado por receptação em 29/02/2010 (antes da prática do presente delito) , cumprido em regime aberto e que ainda responde a dois processos por furto, sendo que foi condenado definitivamente por 1 deles em 01/02/2011 (após a prática do presente delito).
Na instrução criminal apurou-se que Ambrosino é pessoa bem quista dos seus familiares e conhecidos. Sempre trata bem às pessoas, sendo cordial e prestativo. Contudo, largou a faculdade e nunca gostou de trabalhar, estando sempre acompanhado de pessoas mal vistas no bairro.
Apurou-se ainda que na tarde da data do furto, logo após adquirir a bicicleta de maior valor, a vítima teve um desentendimento com o autor e xingou-o dizendo que ele era um derrotado, um “Zé-Ninguém”, que não trabalhava e nunca teria condições de ter uma bicicleta igual a dele.

VAMOS CALCULAR A PENA-BASE:
1)      Ambrosino cometeu furto duplamente qualificado;
2)      A pena do furto qualificado é de 2 a 8 anos;
3)      Para cálculo da pena-base, vamos considerar apenas a qualificadora  da escalada e rompimento de obstáculo. A qualificadora do concurso de pessoas será considerada como circunstância judicial. Se houvesse a hipótese agravante genérica de concurso de pessoas, esta circunstância seria considerada como agravante.
4)      Parte-se sempre da pena mínima (2 anos para a espécie de crime cometido);
5)      Tendo em vista que há 8 circunstâncias judiciais descritas no art. 49, do CPB. Cada circunstância judicial representará 1/8 da diferença entre o mínimo e o máximo. Entre a pena mínima (2 anos) e a pena máxima (8 anos) há um intervalo de 6 anos, ou seja, 72 meses. 1/8 de 72 (72 ÷ 8) é igual a 9 meses. Então, para cada circunstância judicial desfavorável aumenta-se a pena em 9 meses;
6)      As circunstâncias judiciais favoráveis não diminuem a pena, apenas não a aumenta.
7)      Logo:
a)      Culpabilidade: Desfavorável (mais 9 meses). Ambrosino agiu com dolo intenso para subtrair o bem, pois sabedor da existência das bicicletas de alto valor na casa de seu irmão, valeu-se de grande esforço para consumar o delito.
b)      Antecedentes: Desfavorável (mais 9 meses).  Ambrosino possui condenação posterior ao furto na casa do seu irmão.
c)      Conduta social: Neutra. Apurou-se que Ambrosino é pessoa com bom relacionamento social, sendo, inclusive, auxiliar do padre da paróquia e pessoa querida por seus vizinhos e amigos. Contudo, não gosta de trabalhar, abandonou a faculdade porque não gosta de estudar, mas cursou até o ensino médio e se encontra, habitualmente, em más companhias. Assim, os elementos da conduta social de Ambrosino se compensam e não há aumento da pena.
d)      Personalidade: Impossível de aferir. O Juiz não é profissional apto a aferir a personalidade das pessoas.  Tal trabalho encontra-se no ramo da Psicologia e Psiquiatria. Temerário para um Juiz fazer juízo sobre a personalidade do agente quando não se encontram nos autos, laudos periciais atestando que a personalidade do autor é deturpada. No presente caso, não há nos autos o referido laudo, nem outros elementos capazes de fazer prova necessária de que Ambrosino possui personalidade reprovável.
e)      Motivos do crime: Desfavorável (mais 9 meses). Os motivos do crime são desfavoráveis, tendo em vista que Ambrosino agiu por motivo fútil, representado pela vontade de vingar-se da humilhação sofrida. frise-se que a vontade de obter a res furtiva, por si só não justifica a exasperação da pena, tendo em vista que tal fato é inerente ao dolo do tipo de furto.
f)       Circunstâncias do crime: Desfavorável (mais 9 meses). Nesse caso, considera-se o concurso de pessoas como circunstância desfavorável, tendo em vista que tal fato ainda não foi considerado, pois como o crime possui 2 qualificadoras, até este momento, apenas a escalada foi sopesada.
g)      Conseqüências do crime: Favorável. Não houve nenhuma conseqüência mais drástica para a vítima, tendo em vista que a res furtada foi devolvida.
h)      Comportamento da vítima: Favorável. Verifica-se que a vítima, com o seu comportamento arrogante, acabou por incentivar o irmão a praticar o crime.

8)      Verifica-se que, da análise das circunstâncias judiciais do crime, a delas são desfavoráveis;
9)      Considerando que cada uma das circunstâncias judiciais exaspera a pena em 9 meses. Tem-se que a pena-base a ser aplicada é de 5 anos (2 anos da pena mínima + 3 anos de exasperação da pena (9 meses vezes 4 circunstâncias desfavoráveis é igual a 36 meses, ou 3 anos).

2ª. ETAPA: ATENUANTES E AGRAVANTES:

As atenuantes e agravantes são aplicadas sobre a pena base e jamais podem reduzir a pena a aquém do mínimo ou elevá-la além do máximo.
Assim como no caso das circunstâncias judiciais, não existe uma regra matemática para esse cálculo, sendo um critério discricionário do Juiz, todavia, pode-se reduzir a pena em 10% ou aumentá-la em 10% para as agravantes e atenuantes genéricas.

No caso há 2 atenuantes:
1)      Ambrosino é menor de 21 anos na data do fato (art. 65, inciso I, do CPB);
2)      Ambrosino confessou o crime espontaneamente (art. 65, inciso III, alínea “d”, do CPB)
E 2 agravantes:
            1) Reincidência (art. 61, inciso I do CPB)
            2) Ter o agente praticado o crime contra irmão (art. 61, inciso II, alínea “e”)
Conforme se vê, há concurso entre atenuantes e agravantes.
O art. 67 do CPB diz que: “No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência”

Circunstâncias preponderantes são aquelas que prevalecem sobre as demais.
De acordo com o descrito no art. 67, as circunstâncias preponderantes são as que se referem aos motivos do crime (torpe, fútil, relevante valor social ou moral, etc.), à personalidade do agente (menoridade, velhice) e à reincidência.
Destarte, a reincidência (preponderante) supera a confissão espontânea (não preponderante).
Se houver concurso entre duas circunstâncias preponderantes, por ex, reincidência e relevante valor social (preponderante por ser motivo), uma exclui a outra.
Se houver concurso entre 2 circunstâncias não preponderantes, por ex. confissão espontânea e o uso de veneno, uma neutraliza a outra.
A circunstância da menoridade é PUPERPREPONDERANTE, ou seja, supera todas as demais.
No caso do delito cometido por Ambrosino, há 1 atenuante superpreponderante (menoridade) e 1 atenuante não preponderante (confissão espontânea); 1 agravante preponderante (reincidência) e 1 circunstância não preponderante (crime cometido contra irmão).
Assim, a menoridade será preponderante sobre a reincidência, logo diminui-se 10% da pena; já as demais circunstâncias, por serem ambas não preponderantes, se anulam, não causando qualquer alteração na pena.
A alteração da pena, nesta fase, será aplicada sobre a pena-base determinada na 1º. Etapa e não sobre a pena abstratamente cominada.
Assim, 5 anos (60 meses), menos 10% (6 meses) é igual a 4 anos e 6 meses.
OBS: Por se tratarem de circunstâncias objetivas, ao contrário da circunstâncias judiciais, que são subjetivas, o Juiz não precisa justificar sua aplicação, apenas fundamentá-las com base nas provas existentes nos autos.

3ª. ETAPA: CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO DE PENA: As causas de aumento e diminuição de pena são, via de regra, específicas, ou seja, encontram-se descritas no próprio tipo penal, estabelecendo um quantum específico (1/3, metade, 2/3).
Uma causa de diminuição de pena descrita na parte geral é a tentativa (art. 14, inciso II), aplicável a todos os delitos não consumados. (CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PANA GENÉRICA). Todas as causas de aumento ou diminuição de pena descritas no tipo penal são específicas para aquele determinado delito. Ex. art. 157, §2º, inciso I (a violência ou a grave ameaça que aumenta a pena de 1/3 a ½ é aplicada, neste caso, somente ao crime de roubo),  art. 121, §1º (a violenta emoção que diminui a pena de 1/6 a 1/3 é aplicável, ao crime de homicídio).
No caso do delito cometido por Ambrosino, não há causa de diminuição de pena e verifica-se haver 1 causa de aumento de pena (§1º, do art 155), ou seja, furto cometido durante o repouso noturno.
Nesse caso, o CPB estabelece o aumento de 1/3 da pena.

OBS: quando o quantum de aumento ou diminuição é variável (ex. de 1/6 a 1/3), o juiz deverá avaliar o índice de aumento ou diminuição levando em conta as circunstâncias judiciais do crime (art. 59, do CPB). Quanto pior forem as circunstâncias judiciais do crime, maior será o índice de aumento e menor o índice de diminuição; Quanto melhor forem as circunstâncias judiciais, menor será o índice de aumento e maior o de diminuição.

No caso de Ambrosino, o índice fixado por lei é fixo, ou seja, 1/3.
            Observe-se que as causas de aumento e diminuição de pena, não mais se aplicam à pena-base, mas a pena encontrada após a aplicação das agravantes e atenuantes, ou seja, 4 anos e meio (54 meses).
            Assim: 54 meses mais 1/3 (18 meses) é igual a 72 meses, ou seja, 6 anos, sendo esta a pena final aplicada a Ambrosino.

OBSEVAÇÕES: Segundo o parágrafo único do art. 68: “No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.”
ASSIM:
1)             Se houver 2 ou mais causas de aumento genéricas (previstas na Parte Geral), todas elas terão incidência;
2)             Se houver 2 ou mais causas de aumento específicas (previstas no próprio tipo penal), o juiz limitar-se a aplicar a causa que mais aumenta, devendo a outra atuar como agravante genérica, se estiver descrita no rol dos arts. 61 e 62 do CP. Caso não estejam descritas, serão consideradas como circunstância judicial, quando da dosimetria da pena base.
3)             Se houver causa de aumento e de diminuição. Aplicam-se ambas. Primeiro a diminuição.
4)             Se houver 2 ou mais causas de diminuição genérica, todas serão aplicadas. Ex. Semi-imputável que pratica tentativa de furto. Diminui-se a pena pela tentativa (1/3 a 2/3). Após essa redução, diminui-se novamente de 1/3 a 2/3, em razão da semi-imputabilidade. Somente após a apuração da pena diminuída por uma das causas é que se diminui novamente em razão da segunda causa.
5)             Se houver 2 ou mais diminuições específicas (previstas no próprio tipo), o juiz aplicará a causa que mais diminua. A outra será considerada atenuante genérica objetiva (se estiver no rol do art. 65, do CPB), atenuante genérica subjetiva (art. 66, do CPB) ou como circunstância judicial a ser analisada quando da dosimetria da pena-base.
6)             Havendo causas de diminuição genérica e específica, ambas terão incidência. Ex. furto tentado praticado por réu primário (art. 155, §1º, c/c art 14, inciso II, do CPB).
7)             De igual forma, havendo causas de aumento genérica e específica, ambas serão aplicadas. Ex. furto continuado praticado durante o período de repouso noturno (art. 155, § 2º, c/c art. 71, ambos do CPB).




[1] PODVAL, Maria Fernanda de Toledo Rodovalho, Maus antecedentes: em busca de um conteúdo, apud COLLE, Juliana de Andrade. Critérios para a valoração das circunstâncias judiciais (art. 59, do CP) na dosimetria da pena.Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 572, 30 jan. 2005. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/6232. Acesso em: 9 maio 2011

[2] FRANCO, Alberto Silva, Código Penal e sua Interpretação Judicial, 7ª ed., São Paulo: RT, 2001, apud COLLE, Juliana de Andrade. Critérios para a valoração das circunstâncias judiciais (art. 59, do CP) na dosimetria da pena.Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 572, 30 jan. 2005. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/6232. Acesso em: 9 maio 2011

[3] TRISTÃO, Adalto Dias, Sentença Criminal: Prática de Aplicação da Pena e Medida de Segurança; 4ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 1998, apud COLLE, Juliana de Andrade. Critérios para a valoração das circunstâncias judiciais (art. 59, do CP) na dosimetria da pena.Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 572, 30 jan. 2005. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/6232. Acesso em: 9 maio 2011

sábado, 23 de abril de 2011

Sobre a nova proposta de plebiscito

Mais uma vez a hipocrisia legislativa grassa em nosso país, afrontando acintosamente a capacidade de raciocínio crítico de todos nós. Cada nova tragédia desencadeia a avalanche verborrágica eleitoreira a o incansável e dolorido massacre midiático. Não podia ser diferente com chacina dos estudantes da escola de Realengo. Novamente se descute alterações nas leis, com a máxima urgência, pois não se pode deixar que o colega se adiante nas ideias. Plebscito. Esta é a palavra que está na ordem do dia. Vamos decidir (de novo) se a venda de armas será proibida no Brasil. Ora, será que a violência urbana imprescinde da anuência do Estado para existir? Pessoas que fazem uso de arma de fogo para fins criminosos realmente vão comprar armas no comércio legl? Não é com novas leis ou embargos que se resolvem os problemas nacionais. Farto e confuso já é o nosso acervo legislativo. Mister que as leis sejam aplicadas e que as pessoas tenham, se não certeza, pelo menos receio plausível de sofrer as sanções legais respectivamente cominadas. No último domingo (10/04/2011) a rede Record exibiu uma reportagem de fôlego sobre a “Cracolândia”, a qual dá a dimensão real da sensação de impunidade que, sem a menor margem para dúvidas, incentiva práticas ilícitas. O delinquente acredita que não será pego; se for pego, não será processado; se processado, não será condenado (adequadamente); se condenado, não cumprirá sua pena; se cumprir a pena, pasmem, virará herói nacional . É ela, a impunidade, a inação estatal o móvel da criminalidade. É ela que arma e instiga a delinquência, que garante liberdade de ação a traficantes (inclusive os institucionalizados) de armas, as quais vão parar nas mão de criminosos e psicóticos. É a certeza de que não haverá atuação do Estado que garante o suprimento de armas, de entorpecentes na “cracolândia” paulistana e nos demais pontos de vendas de drogas do país. Inócuo qualquer pedido de justiça para as vítimas de Realengo. Não há justiça possível para o caso. Tão inútil quanto são as várias ideias de desarmamento. Somente a certeza da punição será capaz de inibir a ação de vendedores de armas ilegais. Que fim levou a “Operação Guilhotina” e tantas outras com nome pomposo? Onde está a continuidade do processo repressivo? A poeira já abaixou? Não sejamos tolos em franquear mais um delírio político despido de qualquer eficácia. Exijamos, ao contrário, efetividade punitiva. É certo que não se pode evitar que psicóticos, esquizofrênicos, psicopatas ou seja lá o que for, resolvam tornar-se franco atiradores, mas é possível evitar-se que tais pessoas tenham acesso a meios eficazes para consumar seu desiderato.

O PRINCÍPIO DA IGUALDADE COMO RAZÃO ESSENCIAL DO PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR



“Se você encontra uma porta a sua
frente, pode abri-la ou não. Se você
abrir a porta, pode ou não entrar e
uma nova sala. Para entrar, você vai ter
de vencer a dúvida, o titubeio ou o
medo. Se você venceu, dá um grande
passo: nesta sala, vive-se.
Mas tem um preço: inúmeras outras
portas que você descobre.
O grande segredo é saber: quando e
Qual porta deve ser aberta.”
(IÇAMI TIBA, A Porta)

É de sabença comezinha que os princípios constitucionais traduzem-se na razão de ser de todas as normas infraconstitucionais, mormente o princípio da dignidade humana que tem como bastião o princípio da igualdade. Eis que tal princípio está consagrado não apenas no seu artigo 5º, mas espraiado, ainda que implicitamente, em todo texto magno.

Destarte, sob pena de abraçarmos uma exegese eminentemente literal e gramatical do texto constitucional e ignorar a plenitude interrelacional do Direito, faz-se mister a consideração de que o princípio da vulnerabiliade (art. 4º, I, CDC) trata-se de uma espécie do gênero eqüidade, igualdade ou isonomia.

No que tange às teorias e práticas de vanguarda sobre o Direito é cogente clarear que a postura extremamente positivista e acrítica de interpretação dos textos legais tem sido combatida de modo ferrenho e gradualmente substituída por uma interpretação holística, voltada para a totalidade e unissonidade do Direito. Torna-se arcaica e inaplicável a lei interpretada em si mesma. Urge o resgate do antropocentrismo em substituição ao lexcentismo. Daí ressai a Teoria Tridimensional do Direito, proposta por Miguel Reale, a qual insere a norma reguladora do fato social concreto dentro de um âmbito axiológico, ou seja, a lei só será eficiente se aplicada em respeito aos valores da coletividade a qual se aplica.

Como futuros operadores do Direito e integrantes de uma era humanística e sociológica, temos a importante responsabilidade de despojar o Direito do seu excesso de formalidade e estender a sua aplicação a todos os cidadãos de maneira o mais subjetiva possível. Já não nos é admissível a concepção de um Direito divorciado da axiologia filosófica da ética e da moral, como previa o neokantismo e o kelsenismo.

Desta feita, um Estado Democrático de Direito, em todos os seus ramos, reger-se-á pelos princípios e fundamentos consagrados na sua “Certidão de Nascimento”, ou seja, em sua Constituição Federal.

Conforme o inciso III do artigo 1º da nossa Lei Maior, a dignidade humana é um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. Portanto, todas as normas infraconstitucionais têm que estar baldrameadas neste princípio, sem a necessidade de que todo diploma legal o traga expressamente, bastando, portanto, que ele ali se instale de modo implícito e tácito ou ainda, sob outra designação.

Quanto ao princípio da igualdade, ou isonomia, ou eqüidade consagrado no artigo 5º da Carta e ratificador do princípio da dignidade humana, não está isolado neste artigo, mas o seu efeito se dissemina por toda legislação pátria.

Todos os princípios são interligados e intergarantidores, todos decorrem uns dos outros e se reforçam mutuamente. Portanto, não há como se falar em princípio da dignidade humana sem o princípio da isonomia, ou o princípio da liberdade, ou o princípio da legalidade, ou o princípio da razoabilidade, Enfim... Não há como dissociar os princípios norteadores e capitais da democracia brasileira, senão para fins de estudo dogmático. Na realidade factual, podemos adotar uma postura organicista e considerá-los como células de um mesmo tecido; ou tecidos de um mesmo órgão; ou órgãos de um mesmo sistema; ou sistemas de um mesmo organismo. Em todo organismo legal, o sacrifício de um princípio significa nefastamente o comprometimento de toda estrutura judicial.

Não obstante aprecie prescindível, gostaria de cometer o pecado da redundância e deixar claro que o princípio da igualdade ora referido, não se confunde com o princípio da igualdade objetiva ou formal que iguala convencionalmente todos os homens, como numa sociedade de clones idênticos. É patente que esta visão do princípio da igualdade formal, há muito abandonada pelos doutrinadores, mas infelizmente, remanescente na compreensão de alguns operadores do Direito menos informados, é um fomento à injustiça e um desvirtuador do Estado Democrático de Direito. Contrário senso, a igualdade sugerida é a igualdade subjetiva, a igualdade consagrada pelo nosso ordenamento e que tem como mote, “a igualização dos desiguais pela outorga de direitos sociais substantivos”[1].

Quanto à discussão em questão, é manifesta a relação de vinculação incondicional entre a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 que originou o Código de Proteção e Defesa do Consumidor e a Constituição Federal da República do Brasil. Não fosse a necessidade insofismável da tutela legal do consumidor e a imprescindibilidade de que essa tutela se fizesse de uma maneira efetiva, a presente lei poderia ser considerada tão somente como Lei Complementar, vez que tem sua previsão expressa no inciso XXXII do artigo 5º da Constituição Federal o qual estabelece que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. Destarte, ficou transparente a intenção do legislador originário em conferir maior proteção ao consumidor visando, sem nenhuma dúvida, os princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia. Todavia, optou-se pela codificação pelos motivos apresentados pelos autores do anteprojeto.



“Primeiramente, dá homogeneidade a um determinado ramo do Direito, possibilitando sua autonomia. De outro, simplifica e clarifica o regramento legal da matéria, favorecendo, de uma maneira geral, os destinatários e os aplicadores da norma”.[2]

O Código de Defesa do Consumidor se nos apresenta como a ferramenta concreta para a realização de um fundamento constitucional. Não lhe facultando, por conseguinte, em nenhum momento dissociar-se desta ou de qualquer dos seus princípios, sob pena de tornar-se com ela colidente e, conseqüentemente, inaplicável. Conclui-se, pois, que todos os princípios constitucionais estão contidos em todas as normas infraconstitucionais, inclusive no Código de Defesa do Consumidor. Ainda que se amparem em designação distinta (princípio da vulnerabilidade, in casu), a substância tem que ser a mesma.

Ainda, à luz da obra citada, podemos detectar a relação estreita que existe entre o princípio da vulnerabilidade e o da eqüidade em vários momentos. Ao reconhecer os consumidores como parte vulnerável da relação no mercado de consumo, os autores do anteprojeto justificaram essa vulnerabilidade pelo “tratamento desigual para partes manifestamente desiguais”.[3] Valem-se, portanto, da legenda característica do princípio da igualdade substancial, constitucionalmente afiançado para justificar o princípio da vulnerabilidade constante do Código de defesa do Consumidor.

A definição do princípio da vulnerabilidade feita pelos autores permite uma interpretação das mais singelas de que o princípio da vulnerabilidade é apenas uma variante nominal do princípio da isonomia.

A idéia de igualdade e vulnerabilidade remonta a tempos longínquos, haja vista que já era propagada pelo industrial Henry Ford na célebre frase “O consumidor é o elo mais fraco da economia; e nenhuma corrente pode ser mais forte do que seu elo mais fraco”. Todavia, essa nova interpretação encontra-se abalizada, pura e simplesmente, em seu caráter ilustratório, haja vista que, se levarmos em consideração os valores da época em que foi dita, mormente seu autor, temos que tal idéia visava tão somente a igualar os consumidores de poderes aquisitivos e consumistas, certamente ele jamais cogitou a igualdade de direitos. Segundo sua teoria, a capacitação consumeirista do maior número possível de pessoas aumentaria monstruosamente os ganhos dos industriais que apostassem na produção menos dispendiosa e mais célere do modelo de produção (linha de montagem) por ele concebido.

Caso análogo ocorreu no Brasil de 1850, quando a Inglaterra pactuou um acordo com D. Pedro II, proibindo a entrada de negros vindo da África no território tupiniquim e iniciando uma campanha político-econômica radical para a abolição da escravatura e a declaração de “igualdade” de direitos dos negros. Em nenhum momento podemos crer que os britânicos estivessem se importando com a qualidade de vida da população negra do Brasil, mas visavam garantir poder aquisitivo ao imenso contingente de consumidores potenciais para suas mercadorias.

É nesse mesmo sentido que devemos entender as palavras de Ford, contudo nada nos impede que as utilizemos e as interpretemos de acordo com a nossa realidade contemporânea, ou seja, uma realidade com fins humanísticos e igualitários, uma realidade que prima pela igualdade e liberdade dos homens, em que o Direito só pode ser concebido em toda a sua tridimensionalidade. Por isso, é que a Constituição Federal buscou munir o nosso ordenamento jurídico de artifícios legais para garantir proteção do hipossuficiente, criando uma igualdade substancial entre o consumidor e o fornecedor; entre o trabalhador e o empregador, dentre outros. Sendo assim, o ordenamento jurídico brasileiro se apresenta provido de dispositivos capazes de estabelecer um equilíbrio justo nas mais diversas relações jurídicas (dentre esses dispositivos está o princípio da isonomia convertido em princípio da vulnerabilidade no Código de defesa do Consumidor).

O Direito é unitário, esquartejá-lo em ramos completamente incomunicáveis é crime contra o bom senso e a principiologia básica. Todos os ramos do Direito são partes indissociáveis e intercomunicantes, logo não há que se distinguir entre um princípio constitucional e um princípio do Direito Civil ou Administrativo, ou Comercial. Todos os princípios infraconstitucionais devem ser obrigatoriamente harmônicos e convergentes para a Constituição Federal. Não se admite que um princípio constitucional esteja ausente em qualquer norma inferior. Os liames que interligam os vários ramos do Direito entre si e com os princípios axiológicos e teleológicos constitucionais não podem ser desfeitos sob pena de se esquartejar também a democracia.

Ratificando a tese de que tanto o Código de Defesa do Consumidor quanto o princípio da vulnerabilidade integrante deste são gêneros de uma mesma espécie, Roberto Senise Lisboa, reconheceu:

“O reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor decorre do princípio constitucional da isonomia, partindo-se a idéia segundo a qual os desiguais devem ser tratados desigualmente, na proporção de suas desigualdades, a fim de que se obtenha a igualdade desejada”[4]

Com o mesmo entendimento Maria Celina Bobin de Moraes, em citação de Alinne Arquete Leite Novais assevera que:

“Assim é que qualquer norma ou cláusula negocial, por mais insignificante que pareça, deve se coadunar e exprimir a normativa constitucional. Sob essa óptica, as normas de direito civil necessitam ser interpretadas como reflexo das normas constitucionais. A regulamentação da atividade privada (...) deve ser, em todos os seus momentos expressão da indubitável opção constitucional de privilegiar a dignidade da pessoa humana (...)”[5]

Conclui-se facilmente destas citações que a aplicação dos princípios elencados no artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor, inclusive o princípio da vulnerabilidade, a todas as relações jurídicas de cunho consumeirista é uma decorrência do reconhecimento da normatividade dos princípios supremos da Constituição Federal.

Ainda na intenção de corroborar a identidade entre os princípios, revelam-se mui pertinentes as palavras do advogado especializando em Direito Empresarial pela Escola Superior de Advocacia de Minas Gerais e em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Dr. Tiago Maranduba Schröder, em artigo publicado Publicada no Juris Síntese nº 29 - MAI/JUN de 2001. Cujo trecho ora transcrevo:

"Todos são iguais perante a lei", igualdade, isonomia, eqüidade (no sentido aristotélico do termo), seja como for denominado, significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Este o fundamento do Código de Defesa do Consumidor. Verificando que numa sociedade massificada o consumidor se apresentava em posição bastante inferior ao fornecedor, o legislador ordinário, atendendo aos auspícios constitucionais, criou mecanismos, substanciais e adjetivos, que antes de constituir privilégios, são aplicação do princípio da isonomia. (...) Isonomia que não fica sujeita a critérios discricionários, advém da Lei Maior, que previu a vulnerabilidade do consumidor frente ao fornecedor, assim como o fez para os particulares perante o Poder Público e com os trabalhadores perante os empregadores. Distinções que podiam e deviam ser feitas pelo Poder Constituinte Originário, conquanto representassem os anseios do povo”.[6]

Com entendimento similar, para o consultor de empresas, Luiz Otavio de Oliveira Amaral, o princípio da vulnerabilidade é:

“O princípio dos princípios, não se trata de presunção legal (logo inadmissível prova em contrário), mas de pressuposto fático necessário à justa equação das relações de consumo. O consumidor já por definição é vulnerável, sendo, pois, esta a sua característica imanente, sua qualidade intrínseca e indissociável. É, enfim, a aplicação plena do principio natural/constitucional da isonomia (tratar desigualmente segundo as desigualdades)”[7]

Em palestra proferida no CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS da EMERJ - FÓRUM PERMANENTE, o palestrante Defensor público Dr José Augusto Garcia de Sousa dissertou sobre o tema: "PROBLEMAS PROCESSUAIS DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR", em determinado momento de sua palestra declarou que:

”O Código de Defesa do Consumidor veio em prol de uma isonomia material, substancial. Então, aqui há dispositivos altamente favoráveis ao consumidor para que se obtenha essa isonomia material, substancial; e as vantagens a favor do consumidor devem ser na medida certa para que se busque essa isonomia material (...) esse Princípio da Vulnerabilidade vai refletir Princípios Constitucionais”.[8]

Conforme as citações supra, a Constituição Federal de 1988, consagrou princípios gerais da cidadania que não podem ser desprezados pelo juiz ou qualquer outro profissional da área jurídica, quando da apreciação da realidade fenomenológica. Mas, tais princípios constitucionais, como o caso daqueles que se encontram no preâmbulo do texto Constitucional, por exemplo, a segurança, o bem estar, a igualdade da justiça, o desenvolvimento, a dignidade da pessoa humana, etc., nem sempre estão taxativamente expressos na legislação infraconstitucional. Não podemos principiar o estudo da Organização do Estado brasileiro pelo artigo primeiro de sua Constituição Federal, muito ao contrário, devemos considerar a introdução da Carta Magna que se dá no seu preâmbulo que também é parte do texto constitucional, inserindo, e tornando visível para os intérpretes, princípios que devem ser seguidos por todos aqueles que tiverem sob sua égide.

O fundamento do Estado Democrático de Direito é a cidadania fortalecida e em função do caráter cidadão da nossa Constituição, o legislador foi estimulado a criar uma lei verdadeiramente cidadã que é o Código de Defesa do Consumidor, dentre outras. Nunca é pleonástico ressaltar que o caráter do Código de defesa do Consumidor é principiológico, ou seja, prescinde da referência do princípio constitucional a que se refere em todos os diplomas legais, posto que estes estão esparzidos por todos os textos legislativos, bastando para identificá-lo, uma simples destreza de interpretação constitucionalística voltada para o ontológico e não para o regulamento frio e cristalizado da lei. Em que pese já se tenha passado 15 anos da promulgação da Constituição Cidadã, muitos intérpretes ainda estão arraigados à cultura jurídica anterior em que só havia no panorama jurídico nacional leis normativas petrificadas em textos escritos que previam solução só para os casos concretos.

Muito ao contrário do que se possa imaginar, o princípio da vulnerabilidade do consumidor não é aquele que sempre acoberta o consumidor e que lhe dá razão incontinenti, mas reconhece a sua hipossuficiência frente ao poder do fornecedor. Não raro a lei reconhece a desonestidade de algum consumidor aventureiro e lhe imputa as conseqüências do fato. O fornecedor não fica refém de um sistema protecionista, pois tem assegurados os direitos do contraditório e da ampla defesa inseridos no princípio do devido processo legal, valendo-se dos instrumentos necessários para a defesa dos seus direitos, como os artigos 301 e incisos, 265, IV, a, e 267, IV, todos do Código de Processo Civil, dentre outros.

O artigo 5º da Constituição Federal em seu inciso XXXII, ao estabelecer que o Estado deve promover a defesa do consumidor, assegurou essa proteção ao cidadão como um direito fundamental, destarte reconheceu a vulnerabilidade do consumidor na relação de consumo. Vulnerabilidade esta que, se se aplicasse a imparcialidade absoluta da isonomia formal, quebraria o equilíbrio entre as partes e a dignidade da pessoa humana. Por isso o Código de Defesa do Consumidor tem a função primordial de tutelar o consumidor hipossuficiente e reequilibrar as relações de consumo, sem ferir o princípio constitucional da isonomia, tratando os desiguais de modo desigual. Seguindo este raciocínio, conclui-se que a proteção jurídica conferida ao consumidor lhe proporciona o acesso à justiça real, o que significa o equilíbrio no contraditório e a equiparação de armas dos litigantes.

Nelson Nery Junior observa que:

“Deve-se buscar a paridade das partes no processo no seu sentido efetivo, de fato, e não somente a igualdade jurídica formal, uma vez que esta última seria facilmente alcançável com a adoção de regras legais estáticas (...)Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, é a substância do princípio da isonomia”.[9]

Sem sombra de dúvida, o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor é a “prima ratio” do Código de Defesa do Consumidor em garantia à realização do princípio da isonomia garantido na Constituição Federal. Pois, fosse o consumidor equânime ao fornecedor, não haveria hipossuficiência e, por conseguinte, a isonomia formal poderia ser mantida, não se justificando a edição de uma lei com caráter protetor. Em outras palavras,a vulnerabilidade do consumidor é o próprio fundamento da existência do Código de Defesa do Consumidor. João Batista de Almeida enfoca o princípio da isonomia, dentre os princípios específicos aplicáveis à tutela do consumidor, como pilar básico que envolve essa problemática. Ele assevera que:

“Os consumidores devem ser tratados de forma desigual pelo CDC e pela legislação em geral a fim de que consigam chegar à igualdade real. Nos termos do art. 5o da Constituição Federal, todos são iguais perante a lei, entendendo-se daí que devem os desiguais ser tratados desigualmente na exata medida de suas desigualdades”.[10]

O privilégio fático e, portanto, a hipersuficiência técnica e econômica do fornecedor reside no fato de ele possuir, via de regra, a técnica da produção que vai de acordo com seus interesses e o poder econômico superior ao consumidor. A vulnerabilidade do consumidor é patente, e a sua proteção como uma garantia é uma conseqüência da evolução jurídica pela qual passamos. O Código de Defesa do Consumidor é a concretização da prestação jurisdicional em saudação ao princípio constitucional da eqüidade incrustado de forma tácita, porém irrefragável, no referido diploma.

Ignorar a necessidade do Código de Defesa do Consumidor no nosso ordenamento seria permitir que as relações jurídicas entre as pessoas potencialmente desniveladas fossem travadas com o mesmo grau de liberdade e privilégios, conforme praticado no modelo jurídico sepultado pela Constituição Cidadã.

Com a preponderância de um tratamento desigual para pessoas desiguais, levando em conta que o consumidor está em situação de manifesta inferioridade frente ao fornecedor de produtos e serviços, não há que se questionar a legitimidade da presença do princípio da isonomia no Código de Defesa do Consumidor, não apenas no inciso I do artigo 4º, mas na totalidade do seu corpo legal. A permuta terminológica pelo princípio da vulnerabilidade foi um mero capricho do legislador que procurou dar especificidade ao princípio da eqüidade que é mais genérico. Poderíamos compreender, de tal sorte, que princípio da vulnerabilidade é o princípio da igualdade aplicado especificamente às relações de consumo.

Outra questão relevante no rebatismo do princípio em tela é a efetiva garantia de que nenhum julgador legalista e conservador tendesse a aplicar a igualdade formal ou objetiva, deixando assim o consumidor em franca desvantagem. Contudo, quando determinado o principio da igualdade substancial (como foi feito na avaliação de Direito do Consumidor), nenhuma dúvida resta quanto à desigualdade reconhecida pela própria lei.

Em nossa formação diuturna é imperiosa a compreensão do Direito atuando sobre os fatos reais e não sobre questões teórico-jurídicas. Devemos sempre ter presente a sua dinamicidade em domínio à sua estaticidade. Infelizmente não basta que tão somente nós, os graduandos, consigamos vislumbrar essa face holística do Direito contemporâneo. Tão importante quanto a prontidão acadêmica, é a prontidão doutrinária e didática do professor universitário para acolher e conduzir tal clientela rumo ao Direito libertário. Desta feita, devemos todos, docentes e discentes, concebê-lo atrelado aos fatos sociais hodiernos que correm contra o tempo e evoluem de forma agílima e, muitas vezes, surpreendente, atropelando os lineamentos estruturais outrora vigentes.

“Não é a lei, pois, que sempre muda a realidade social, mas esta que exige adequação das normas a um novo tempo, o que se efetiva através da função desbravadora da jurisprudência. O julgador, inserido na realidade de seu tempo, não pode negar-se a julgar por omissão da lei, nem aplicá-la com os olhos postos no passado, mas sintonizado com a dinâmica social. A imobilidade e alienação à realidade só podem conduzir à injustiça. Justa é a decisão que mantém o ordenamento jurídico vivo e sintonizado com a realidade" ( in Ap. 193051083, 4a CCTARSP, rel. Márcio Oliveira Puggina)

Além isso, não podemos olvidar de reconhecer o princípio da hierarquia legal. A Constituição Federal é soberana a toda e qualquer forma legal existente. Nenhuma outra lei pode contradizê-la ou ignorá-la. O silogismo é primário: “se os princípios regem a Constituição Federal e a Constituição Federal rege todas as leis infraconstitucionais; logo, todas as leis infraconstitucionais são regidas pelos princípios constitucionais”. Nenhuma lei, norma, decreto, portaria, enfim... Nenhuma disposição de lei escapa a esta regra. Os princípios constitucionais encontram-se gravados em todos as leis brasileiras e ninguém, sob qualquer pretexto, pode desconsiderar esta regra basilar do Direito e excluir, por seu alvitre, um princípio constitucional de qualquer norma infraconstitucional.

Outro instituto do Código de defesa do Consumidor é a permissão da inversão do ônus da prova em favor do consumidor sempre que verossímil sua alegação. Trata-se de outro momento de aplicação do princípio constitucional da isonomia, pois o consumidor como parte hipossuficiente na relação de consumo, tem de ser tratado de forma diferente, a fim de que seja alcançada a igualdade real entre os partícipes da relação de consumo. Mais uma vez o Direito vale-se da máxima ruibarboseana de que a democracia e a verdadeira justiça se baseiam em considerar desigualmente os desiguais, desigualdade essa reconhecida pela própria lei.

Não resta a mínima dúvida de que a lei de proteção do consumidor municiou o Judiciário de instrumentos jurídicos adequados para restabelecendo o equilíbrio e a igualdade nas relações de consumo profundamente abalada pela nova ordem de mercado.

O Direito do Consumidor não é matéria auto-suficiente, ao contrário, apresenta nuances do Direito Civil, Penal, Constitucional, Administrativo, Tributário, Internacional, Comercial, Econômico, Processual, Penal, etc. Faz-se imperativo para o entendimento global e aplicabilidade da matéria, o entrelaçamaneto com as outras disciplinas. Um entendimento isolado do Direito do Consumidor nos deixará completamente alheios da sua aplicabilidade prática, favorecendo, de tal sorte, o exasperado positivismo, conservadorismo, intransigência e obstaculação crítica e doutrinária na aplicação do Direito em comprometimento do exercício da justiça.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor, 2 ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

AMARAL, Luiz Otávio de Oliveira. Os transgênicos e o consumidor brasileiro: Nações Unidas na Defesa do Consumidor", CNDC/MJ, Brasília, 1986.

FUX, Luiz. Revista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Volume 4. n.° 15. 2001.

GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos; FINK, Daniel Roberto; FILOMENO, José Geraldo Brito; WATANABE, Kazuo; JUNIOR, Nelson Nery; DENARI, Zelmo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado Pelos Autores do Anteprojeto, 7 ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.

LISBOA, Roberto Sanise, Responsabilidade civil das relações de consumo. São Paulo: Ed. Revista dos tribunais, 2001.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do Consumidor em Juízo, 2 ed., São Paulo: Saraiva, 1998.

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 1998.

MATOS, Cecília. O Ônus da Prova no Código de Defesa do Consumidor, Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de direito da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Kazuo Watanabe, 1993.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro. Editora Malheiros. 2002.

NERY JÚNIOR, Nelson. Os princípios gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n. 3, set./dez., 1992.

NOVAIS, Alinne Arquete leite. A teoria contratual e o Código de defesa do consumidor. São Paulo: revista dos tribunais, 2001.

REALE, Miguel. Lições Preliminares do Direito. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

Schröder, Tiago Maranduba. In Aspectos da defesa do consumidor em juízo: a inversão do ônus da prova nas ações de repetição de indébito. Juris Síntese nº 29 - MAI/JUN de 2001

SILVA, José Afonso da, Curso de direito constitucional positivo. 20 ed. São Paulo: Malheiros editores, 2002.

SOUZA, José Augusto Garcia de. Problemas processuais do código do consumidor. In ata da 15ª reunião do fórum permanente dos juízos cíveis. 24/04/2001, às 10 horas.

WATANABE, Kazuo, Anotações de palestra proferida no XXI Encontro Nacional de Defesa do Consumidor, ocorrido em João Pessoa /PB em 21.06.01.


--------------------------------------------------------------------------------

[1] SILVA, José Afonso da, Curso de direito constitucional positivo. 20 ed. São Paulo: Malheiros editores, 2002, p. 210.

[2] GRINOVER, Ada Pellegrini...[et al.]. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 09.

[3] Ibdem, p. 17.

[4] VAL, Olga Maria do, política nacional das relações de consumo. Apud. LISBOA, Roberto Sanise, Responsabilidade civil das relações de consumo. São Paulo: Ed. Revista dos tribunais, 2001, p. 84.

[5] MORAES, Maria Celina Bobin de, A caminho de um direito civil constitucional. Apud. NOVAIS, Alinne Arquete leite. A teoria contratual e o Código de defesa do Consumidor. São Paulo: revista dos tribunais, 2001, p.83.

[6] Schröder, Tiago Maranduba. In Aspectos da defesa do consumidor em juízo: a inversão do ônus da prova nas ações de repetição de indébito. Juris Síntese nº 29 - MAI/JUN de 2001

[7] AMARAL, Luiz Otávio de Oliveira. Os transgênicos e o consumidor brasileiro: Nações Unidas na Defesa do Consumidor", CNDC/MJ, Brasília, 1986. O autor é consultor de empresas, advogado militante e professor da Fac. de Direito da Univ. Católica de Brasília-UCB, ex-diretor de Faculdade de Direito em Brasília. Já assessorou Ministros de Estados (Justiça, Desburocratização), foi Secretario geral do Cons.Nac.Defesa do Consumidor-CNDC/MJ, desde o inicio até o fim da elaboração do anteprojeto do Código do Consumidor-CDC. Foi responsável pela estruturação e implantação da defesa do consumidor no Brasil (Procons, Promotorias, delegacias policiais, juizados especiais e entidades comunitárias). É autor de várias obras e artigos jurídicos publicados. Foi um dos primeiros a escrever acerca do tema, inclusive formulando a política inicial do setor e sendo o primeiro executivo da defesa do consumidor na esfera federal.

[8] SOUZA, José Augusto Garcia de. Problemas processuais do código do consumidor. In ata da 15ª reunião do fórum permanente dos juízos cíveis. 24/04/2001, às 10 horas.

[9] NERY JÚNIOR, Nelson. Os princípios gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n. 3, set./dez., 1992.

[10] ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor, 2 ed., São Paulo: Saraiva, 2000.